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Todos os textos © por Igor Barbosa ou devidamente creditados.

10/19/2004

Mais um poema concretista, desta vez com análise 

O céu de Sal
Eu cedo seda
Só do sul
Da Sé da Cida

Agora vamos à análise da obra:

“Eu cedo seda” fala de um espírito libertário, que anseia por todas as satisfações, tanto que estende este anseio aos demais – se falta seda para você, o eu lírico cederá a própria com tanta satisfação como se usasse a seda para enrolar para ele mesmo um cigarrinho do capeta.

“Só do sul” é um protesto contra toda dominação, todo monopólio, toda singularidade – neste caso, “só do sul” é uma negação ao Norte, numa ótica intencionalmente restrita ao caso nacional representado pelo Ceará, que fica ao norte dos centros culturais e produz a maconha mais desejada pelos maconhistas do Brasil (portanto, com grandes potencialidades monopolistas), mas também e principalmente uma declaração de repúdio a toda dominação, como - exemplo mais flagrante - A Euro-Americana e a Judaico-Cristã, ambas oriundas do hemisfério Norte. Consulte-se para isso nosso manifesto pela inversão do Mapa-Mundi e pela criação de bússolas que apontem para o sul (Manifesto pela Pluralidade Geoafrodisotrópica, de Igor Barbosa e Temis Rodar, 107 assinaturas, 2003).

“Da Sé da Cida”, finalizando o poema, completa o sentido da frase ao tomar como referência um ponto geográfico útil para dar significação ao verso anterior e transcende a potencialidade geográfica: de um local concreto, a cidade e centro religioso de Aparecida do norte torna-se um lugar poético incomum, a Sé da Cida, nomeado segundo o falar brasileiro: Religioso e cordial, direto, sem polidezes artificiais, o brasileiro vai à sé da Cida, toma cachaça com Exu e daria uns tratos na pomba-gira, tudo com a mesma devoção.

A relação destes três elementos da vida cotidiana - O desejo, a rebeldia e a fé - com o título fica mais evidente se a estudamos à luz dos presentes estudos literários sobre a condição inativa do potencial redutor de ação no homem e, por conseguinte, na literatura contemporâneos; estudo que muito fica a dever à segunda geração da psicanálise, cujos ensinamentos são pressupostos para a correta compreensão do que se quer dizer: Toda ascece puramente estética (incluindo as radicalmente antiestéticas) está fadada a uma colisão com determinado elemento antisséptico - O céu de sal - que, se lhe purifica por um lado, barra-lhe a psicoeromotricidade por outro.

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10/15/2004

A ignorância é uma benção, 

Exceto a ignorância deste próprio preceito, um dos únicos realmente importantes. Motivos para tanto afirmar me vieram ao longo de meus 100 anos de vida, segundo contagem de minha mulher. Acho bom, a idade nos ensina que a idade não ensina nada, só a má-vontade. Tive mania, em meus verdes anos, de querer saber tudo; mas isso passou naturalmente, como um fastio, um enjôo, um desgosto, até chegar à falta de vontade de saber – Não quero mais saber o que sei, tudo isso me dá engulhos. A ignorância é uma benção.

Há provas, coletadas por mim ao longo da árida estrada rumo à estupidez perfeita; são eles:

1) videmus nunc per speculum in enigmate tunc autem facie ad faciem nunc cognosco ex parte tunc autem cognoscam sicut et cognitus sum. (I Cor, XIII, XII)
2) Há mais coisas que eu não gostaria de saber, e sei, do que coisas que eu gostaria de saber e não sei.
3) A ignorância não induz o ignorante sincero a erros, como faz com os sábios pretensiosos. Logo, quanto mais perfeita a ignorância, menores e mais esparsos os enganos são.
4) Não sentir calafrios ao ouvir a fala estúpida de certas pessoas deve ser ótimo.

E deve haver outras razões que desconheço, graças a Deus.

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10/11/2004

Microcontos, por obediência à norma e falta de inspiração 

Ela disse:
- Mas que horror!
E ele:
- Pois é.

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Um padre dormiu demais e perdeu a hora da missa. Seu primeiro pecado; chegou à igreja (lotada) sem graça.

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Depois de um dia inteiro pescando, um obeso voltava para casa com cinco barrigudinhos de saldo.

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Um grande escritor sem inspiração decidiu escrever microcontos. Escolheu como assunto um escritor sem inspiração, que decidira escrever microcontos sobre o fim do espaço nos microcontos (ou o ponto em que estes tornam-se minicontos).

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A opinião de um homem tolo cresceu excessivamente e matou-o por asfixia, mas ele acha que ainda está vivo.

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10/06/2004

Progresso e Tradição 

Graças ao sistema de livre concorrência e ao esforço de muitas gerações anteriores, hoje a maioria das pessoas vive em melhores condições que reis de séculos passados: Podemos conversar por telefone com gente em Luxemburgo, controlar a temperatura de nossos quartos e locais de trabalho, guardar nossa comida por mais tempo. É isso que chama-se progresso: Conforto adquirido por esforço e trabalho das gerações anteriores.

E o progresso tem custos, como tudo a que se pode aspirar. Estes custos vão de dinheiro privado e público a vidas humanas.

Por isso, quando você liga seu computador para ler um e-mail de sua namorada que viajou, quando você toma um banho quente, quando o microondas aquece seu jantar, pense nas pessoas que sofreram para que você hoje pudesse viver tão bem. Escolha alguma forma de agradecê-las. É isso que se chama tradição: Reconhecer das gerações passadas algo que não precisa ser transformado para ter valor prático.

Troque o Caetano Veloso por Bach. Livre-se deste materialismo torpe e tente acreditar num Deus e amá-lo; é tão fácil, vergonhosamente fácil. Use uma roupa decente para ir fazer compras, seja amável com todas as pessoas, sem exageros de intimidade falsa, mas sempre respeitoso. Não deixe ninguém arremessar insultos aos antigos – Você me deixaria espancar a sua avozinha?

Não confunda progresso com futuro. Tudo que você pode usufruir no mundo é legado do passado; todo progressista sincero é tradicionalista. Entusiasmo pelo futuro é coisa de gentinha que ama o desconhecido e repele o familiar. Não esqueça, o futuro ainda não nos deu nada de bom.
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